sexta-feira, 30 de outubro de 2009
quarta-feira, 28 de outubro de 2009
terça-feira, 27 de outubro de 2009
segunda-feira, 26 de outubro de 2009
Tentativa
O bolo de rolo tem linhas, linhas que têm um quê de destino, como as das mãos. Por isso o como: pra quem sabe mudar o que tá escrito pra mim, pra quem sabe fazer mais doce o que tá escrito pra mim.
sábado, 24 de outubro de 2009
Céu
Pisei no chão. Ele era azul. Tratei, então, de ali construir minha casa. É que aquele pedaço de chão era o meu céu. O céu da minha existência.
sexta-feira, 23 de outubro de 2009
A revolução através do amor
"Onde ele estaria agora com seu gorro? Sua música? Ora, a duração, mas que importava a duração. Foi amor. Passou velozmente como no meu sonho de véspera, quando ele me apareceu com seu guarda-chuva aberto, aquele mesmo, nem cheguei a ver suas feições, só pude advinhar-lhe o vulto. Acenou-me. E sumiu deixando para trás o guarda-chuva e o barulho da motocicleta que logo se confundiu - poeira e som - com o motor de um caminhão de estrada. Mas foi amor. Apurou-se minha autocrítica, nunca pude me ver com tamanha lucidez como me vi. Com uma dureza que muitas vezes fez Rodrigo me repreender, "Não exagere, Aninha, a gente é sempre melhor do que pensa". Mas até nos momentos mais agudos dessa autoflagelação eu tive o que não tivera antes, esperança. Esperança em mim. Esperança nos outros, esperança em Deus, que eu nem sabia se existia ou não, mas que jamais me abandonaria.
"O amoe me levantou no ar e me sacudiu e me revolveu inteira. Fiquei fulgurante em meio dessa mudança que me revolucionou. A revolução através do amor."
Lygia Fagundes Telles
"O amoe me levantou no ar e me sacudiu e me revolveu inteira. Fiquei fulgurante em meio dessa mudança que me revolucionou. A revolução através do amor."
Lygia Fagundes Telles
quinta-feira, 22 de outubro de 2009
domingo, 18 de outubro de 2009
Baús
Na infância, sonhava em explorar o mar, à procura de tesouros naufragados. Não pelos tesouros em si, mas porque pensava que, tirando-os de lá, poderia deixar, no lugar, os baús da sua memória, baús que queria ver carregados pra zona abissal. E, como tudo nela era superfície, a zona abissal tinha de ser externa, tinha de ser alheia.
Não demorou pra ela perceber que a ideia que tinha nunca funcionaria efetivamente. Foi então que passou a fazer dos homens sua zona abissal, passou a confiar a cada um o que não queria nem devia carregar. Mas os homens foram naufragando. E ela nunca soube o porquê. Apenas, por respeito aos tesouros naufragados, evitava se banhar nas águas do mar.
Não demorou pra ela perceber que a ideia que tinha nunca funcionaria efetivamente. Foi então que passou a fazer dos homens sua zona abissal, passou a confiar a cada um o que não queria nem devia carregar. Mas os homens foram naufragando. E ela nunca soube o porquê. Apenas, por respeito aos tesouros naufragados, evitava se banhar nas águas do mar.
quinta-feira, 15 de outubro de 2009
espanhol
é um língua carregada de sentimento. não há palavras neutras. todos os sons são tingidos de vermelho. todos os gestos de fervor. é uma língua que exige sinceridade. é uma língua que nos impede de fingir.
Escrever
"- Escrever não é falar.
- Não? Qual é a diferença?
- É exactamente o oposto. Escrever é usar as palavras que se guardaram: se tu falares de mais, já não escreves, porque não te resta nada para dizer."
(Miguel Sousa Tavares, No teu deserto)
- Não? Qual é a diferença?
- É exactamente o oposto. Escrever é usar as palavras que se guardaram: se tu falares de mais, já não escreves, porque não te resta nada para dizer."
(Miguel Sousa Tavares, No teu deserto)
quarta-feira, 14 de outubro de 2009
terça-feira, 13 de outubro de 2009
Revelação
"'Se toda religião é uma história de revelação, a revelação de uma verdade, então, minha syngué sabour, nossa história também é uma religião. A nossa religião, só nossa!' Ela começa a andar. 'Sim, o corpo é nossa revelação.' Detém-se. 'Nossos corpos, seus segredos, suas feridas, seus sofrimentos, seus prazeres...'"
(Atiq Rahimi, Syngué sabour, Pedra-de-paciência)
(Atiq Rahimi, Syngué sabour, Pedra-de-paciência)
segunda-feira, 12 de outubro de 2009
domingo, 11 de outubro de 2009
Solidão
Ontem vi essa foto aí de cima (chama 'Solidão' e é de um trabalho de Iberê Camargo) e, algum tempo depois, rabisquei no celular: "solidão é não precisar". Rabisquei mas fiquei com a sensação de que já tinha visto essa frase antes. Agora, checando no google, descobri (na verdade, lembrei, né?) que é de Clarice (Lispector). Seja como for, porém, essa frase nunca tinha feito tanto sentido pra mim. Sim, "solidão é não precisar".
sexta-feira, 9 de outubro de 2009
Da série "Tão legal que dá vontade de dividir"
quarta-feira, 7 de outubro de 2009
Bichos
Semana passada, não sei por que, me senti meio caramujo. Isso me fez lembrar de um texto escrito há uns anos, justamente sobre bichos. Chama 'bichos' e diz assim:
Sempre me pareceu engraçada a mania de volta e meia perguntar que bicho o outro gostaria de ser. Talvez por eu nunca ter de fato desejado ser bicho. Mas exatamente porque eu não tinha resposta, exatamente por isso, punha-me a pensar. Sentia-me desconfortável por não saber, uma vez que a impressão que as pessoas me passavam era que isso era algo evidente, uma espécie de determinação a priori (“Bem, eu sou uma pessoa, mas, se assim não fosse, certamente seria um colibri.”).
Na busca por satisfazer a curiosidade alheia, eu empenhava-me em refletir. O primeiro bicho que me recordo haver julgado que gostaria de ser foi um cavalo. Naquela época, era criança. Acho que, imersa em minha ingenuidade infantil, me encantava com o porte e com a aparente liberdade dos cavalos. Hoje, entretanto, vejo que a liberdade dos cavalos é igual à que, nesta altura da vida, tenho. E sei que não posso ser completamente livre porque minha liberdade não depende apenas de mim, assim como o cavalo, que não poderá correr selvagemente se o seu dono não o deixar solto. Mas quem sabe é por isso, por não poder contar com a liberdade todo o tempo, que, quando com ela se depara, o cavalo corre tão belamente.
Depois de desistir do cavalo, escolhi o beija-flor. Queria apossar-me da meiguice e da serenidade que me transmitia aquela ave. Queria a placidez que penso não querer mais. Queria pousar em todos os lugares e não ser de lugar algum para não ter passado e, assim, poder ter uma mente sem lembranças. (Um beija-flor pousa em minha janela/ E, imóvel, contempla minha tristeza/ Ah!, quisera eu ser beija-flor/ Para pelo mundo voar/ Para minhas asas estender sobre o mar/ E o horizonte alcançar/ Quisera eu partir e a tudo deixar/ Em busca de um novo habitat/ Mas o beija-flor, o beija-flor, à procura de outras paisagens segue/ Só eu continuo a chorar).
Hoje acho que escolheria ser uma galinha. Principalmente por causa de Clarice (Lispector). Na verdade, imagino que ela escolheria ser uma galinha, mas não sei se ela me pensaria capaz do mesmo. Quero acreditar que sim.
Escolher ser uma galinha é optar pelo bicho talvez mais humano dentre os bichos. É declarar amor à condição humana, um amor clariceano, fundamental para que se possa ser homem verdadeiramente. A galinha, tal qual o homem, não voa, embora alguns tentem, e aí está sua trágica beleza.
Porco não gostaria de ser. Não pelo porco em si, mas porque ouvi falar que os porcos não conseguem olhar para cima. Não são capazes de ver as nuvens e isso me soa bastante triste. É verdade que as galinhas não podem alcançar as nuvens. Apenas olhá-las, todavia, e ficar a tentar adivinhar com que seu formato se parece é, por vezes, suficiente, já que é meditação que traz de volta a serenidade quando dela mais se precisa.
Também não gostaria de ser leão. Não quero ser rei, nem herói. Não tenho necessidade de ver meu nome escrito nos livros de história. É um preço por demais caro - abdicar da vida para ser herói. Não preciso disso. Não quero isso. “Quero é ser apenas uma semente.” Quero é ser pulsante. Só assim poderei tocar o âmago da minha humanidade.
Não mais cavalo. Não mais beija-flor. Em tempo algum, leão. Em tempo algum, porco. Peixe talvez, ou melhor, não, na sua quietude, ele está bastante distante dos homens. Enfim, galinha, com quem os homens aprenderam a ciscar, remexendo o solo do coração, à procura de alimento.
Sempre me pareceu engraçada a mania de volta e meia perguntar que bicho o outro gostaria de ser. Talvez por eu nunca ter de fato desejado ser bicho. Mas exatamente porque eu não tinha resposta, exatamente por isso, punha-me a pensar. Sentia-me desconfortável por não saber, uma vez que a impressão que as pessoas me passavam era que isso era algo evidente, uma espécie de determinação a priori (“Bem, eu sou uma pessoa, mas, se assim não fosse, certamente seria um colibri.”).
Na busca por satisfazer a curiosidade alheia, eu empenhava-me em refletir. O primeiro bicho que me recordo haver julgado que gostaria de ser foi um cavalo. Naquela época, era criança. Acho que, imersa em minha ingenuidade infantil, me encantava com o porte e com a aparente liberdade dos cavalos. Hoje, entretanto, vejo que a liberdade dos cavalos é igual à que, nesta altura da vida, tenho. E sei que não posso ser completamente livre porque minha liberdade não depende apenas de mim, assim como o cavalo, que não poderá correr selvagemente se o seu dono não o deixar solto. Mas quem sabe é por isso, por não poder contar com a liberdade todo o tempo, que, quando com ela se depara, o cavalo corre tão belamente.
Depois de desistir do cavalo, escolhi o beija-flor. Queria apossar-me da meiguice e da serenidade que me transmitia aquela ave. Queria a placidez que penso não querer mais. Queria pousar em todos os lugares e não ser de lugar algum para não ter passado e, assim, poder ter uma mente sem lembranças. (Um beija-flor pousa em minha janela/ E, imóvel, contempla minha tristeza/ Ah!, quisera eu ser beija-flor/ Para pelo mundo voar/ Para minhas asas estender sobre o mar/ E o horizonte alcançar/ Quisera eu partir e a tudo deixar/ Em busca de um novo habitat/ Mas o beija-flor, o beija-flor, à procura de outras paisagens segue/ Só eu continuo a chorar).
Hoje acho que escolheria ser uma galinha. Principalmente por causa de Clarice (Lispector). Na verdade, imagino que ela escolheria ser uma galinha, mas não sei se ela me pensaria capaz do mesmo. Quero acreditar que sim.
Escolher ser uma galinha é optar pelo bicho talvez mais humano dentre os bichos. É declarar amor à condição humana, um amor clariceano, fundamental para que se possa ser homem verdadeiramente. A galinha, tal qual o homem, não voa, embora alguns tentem, e aí está sua trágica beleza.
Porco não gostaria de ser. Não pelo porco em si, mas porque ouvi falar que os porcos não conseguem olhar para cima. Não são capazes de ver as nuvens e isso me soa bastante triste. É verdade que as galinhas não podem alcançar as nuvens. Apenas olhá-las, todavia, e ficar a tentar adivinhar com que seu formato se parece é, por vezes, suficiente, já que é meditação que traz de volta a serenidade quando dela mais se precisa.
Também não gostaria de ser leão. Não quero ser rei, nem herói. Não tenho necessidade de ver meu nome escrito nos livros de história. É um preço por demais caro - abdicar da vida para ser herói. Não preciso disso. Não quero isso. “Quero é ser apenas uma semente.” Quero é ser pulsante. Só assim poderei tocar o âmago da minha humanidade.
Não mais cavalo. Não mais beija-flor. Em tempo algum, leão. Em tempo algum, porco. Peixe talvez, ou melhor, não, na sua quietude, ele está bastante distante dos homens. Enfim, galinha, com quem os homens aprenderam a ciscar, remexendo o solo do coração, à procura de alimento.
segunda-feira, 5 de outubro de 2009
Unidade
Tenho pensado bastante que, quando a gente se torna melhor, o universo também se torna melhor. Sim, porque, afinal de contas, a gente é parte do universo, né?
A Mercedes Sosa, que soube fazer o universo melhor. Que ela nos inspire.
A Mercedes Sosa, que soube fazer o universo melhor. Que ela nos inspire.
domingo, 4 de outubro de 2009
sábado, 3 de outubro de 2009
roupas velhas
usava as roupas gastas não por falta de novas e de cores vivas
mas por afeição ao tempo que passou
mas por afeição ao tempo que passou
sexta-feira, 2 de outubro de 2009
Dança
Haviam lhe aconselhado dançar pra equilibrar o yin e o yang (na verdade, pra fazê-la por pra fora a energia guardada). Primeiro ela achou que talvez pudesse ser uma boa alternativa. Depois se deu conta de que isso não resolveria. É que, então, passou a ter vontade de dançar ao som do silêncio.
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